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Reportagens Edição 108 - novembro de 2016

Palavras que CURAM


Cartas psicografadas ajudam as famílias a superarem a dor da perda

Quem perdeu um ente querido sabe o quanto é preciso ter força para suportar esse momento tão difícil. O que nos ajuda a superar a dor de uma perda são as boas lembranças que ficam eternizadas na nossa memória e em nosso coração. Por vezes, em algumas situações, queremos acreditar que isso não é verdade, mas a realidade vem e com ela a saudade, junto, muitas lágrimas, sorrisos e histórias. Nessa hora, muitas famílias encontram nas cartas psicografadas consolo, alento e explicações. Confira os depoimentos de pais e mães que perderam seus filhos e encontraram conforto nas cartas psicografadas.


A CERTEZA DO REENCONTRO –
Vítima do incêndio na boate Kiss aos 19 anos de idade, Guilherme Pontes Gonçalves deixou saudade e boas lembranças para a família e amigos. Passados três anos de uma das maiores tragédias do país, que resultou na morte de 242 pessoas, os pais de Guilherme, Mariângela Pontes Gonçalves, 53, empresária, e Ricardo Machado Gonçalves, 53, pecuarista, transformaram a dor da perda na certeza do reencontro através das cartas psicografadas.
“Nosso filho afirma que está vivo, e bem, e que vamos reencontrá-lo um dia. Isto nos dá forças de seguirmos nossa caminhada”. Mariângela Pontes Gonçalves e Ricardo Machado Gonçalves


Formatura do ensino médio de Guilherme no Colégio Marista Roque em dezembro de 2010


TRANSFORMANDO A DOR EM AÇÃO POSITIVA –
O casal presta auxílio material e espiritual, ajuda na organização de palestras e eventos da Sociedade Espírita Nosso Lar, além de fornecer assistência a pessoas em situações similares. “Trabalhamos também com o grupo de pais do livro ‘Nossa nova caminhada’, onde promovemos palestras e organizamos a vinda de médiuns de fora para psicografar”, falam.


TRECHO DA CARTA PSICOGRAFADA DE GUILHERME
“Eu tenho estado por perto, meus pais, e não podia deixar que fosse diferente, e a sensação que a mãe tem que viajo com vocês, é verdade, quando posso me faço presente, pois eu sei do compromisso da mãe e do pai, para continuarem pregando que a vida continua e a mãe tem conseguido isto, muito embora com a face em lágrimas. A mãe, não imagina a repercussão do seu gesto de bondade e de meu pai, e tenho certeza que através da sua bondade já conseguiram aquentar muitos corações, devolver sorrisos, e devolveram muitas alegrias para pais literalmente mortos”. (Carta psicografada em julho deste ano em Uberaba, Minas Gerais)
Fonte: arquivo pessoal



UM AMOR QUE NÃO SE MEDE


A professora Mara Bulsing de Oliveira, 56, perdeu um dos três filhos em um acidente de carro, o João Arthur Oliveira Homrich, aos 23 anos de idade. “Foi numa tarde linda de domingo, quando se reunia com amigos para um chimarrão. Aliás, esta era uma das alegrias dele, estar rodeado de amigos, e tinha muitos”, recorda-se Mara. João Arthur tocava diversos instrumentos musicais e era fã de cinema. Ele formou-se em Publicidade e Propaganda na UFSM e chegou a produzir um curta-metragem com amigos intitulado “A porta”, onde também encenou. Seis meses antes do acidente o jovem havia passado em um concurso público na Universidade Federal do Pampa (Unipampa) em São Borja.


Esta foto foi tirada cerca de seis meses antes do acidente, quando João Arthur veio de Santa Maria para passar o final de semana na casa da mãe


APRENDENDO A LIDAR COM O SOFRIMENTO –
Mara reconhece a dor que sente, mas entende que é preciso saber o que fazer com ela. Seguindo o conselho do filho através de uma carta psicografada, ela tenta todos os dias melhorar e ver que o seu sofrimento não é único, já que tantas mães estão passando pela mesma situação. “Sei que meu filho está em outro plano e está bem, e nos reencontraremos quando for chegado o momento. Ele foi um empréstimo que Deus me fez e eu tive que devolvê-lo, pois era chegada a hora”, fala.


TRECHOS DA CARTA PSICOGRAFADA DE JOÃO ARTHUR


“Minha mãe Mara o teu amor e as tuas preces são bênçãos para mim deste lado da vida. Mãe saiba que quando os bombeiros socorreram meu corpo carnal meu pai me amparava desse lado da vida. [...] Mãe sei que acredita no nosso reencontro e saiba que te amo, recordo com alegria teu modo particular de cuidar dos filhos eu te amo e te agradeço por tudo, nada acabou entre eu e tu. Mil beijos com meu amor e minha paz do vosso querido e abençoado guri”. (Carta psicografada em 3 de junho deste ano)
Fonte: arquivo pessoal


“A vida não é e nunca será mais a mesma, pois vivo sem um pedaço meu e meu coração se partiu em tantos pedaços que não será possível reconstituir. Mas é na dor que devemos nos questionar e crescer”.
Mara Bulsing

 




DO OUTRO LADO DO CAMINHO

Fatima Machado, 47, dona de casa, é mãe de Pedro Henrique Timm, um adolescente de 16 anos de idade que veio a óbito em setembro de 2013 devido a uma bactéria (estafilococos aureus), a qual provocou septicemia (infecção generalizada). Pedro machucou-se durante uma partida de futsal em uma quadra esportiva da cidade.


Fatima tatuou nos braços um desenho feito pelo filho, sua assinatura e uma foto de seu rosto. “Ele queria fazer uma tatuagem em minha homenagem quando fizesse 18 anos. Como ele não conseguiu, eu fiz para ele. Pra mim é ele, é vida”, fala.



LEMBRANÇAS QUE FICAM –
Apegado à mãe, Pedro chegou a fazer um teste para tornar-se jogador de futebol no Esporte Clube Juventude acompanhado de Fatima na cidade de Caxias do Sul. “Tudo pra ele tinha que ser eu. Um filho fantástico, muito correto, amigo dos amigos. Nós sempre estávamos fazendo nossos planos”, recorda-se.



CARTAS DE CONFORTO – Fatima diz que só conseguiu manter-se firme após a morte do filho pela comunicação que existe por meio das cartas psicografadas. “Estou de pé pelas cartas que recebo, quem me ergueu foi o espiritismo, porque no espiritismo tu encontras respostas que te consomem: – ‘Por que meu filho?’ São tantas coisas que passam em tua cabeça”, relata. Para ela, essas cartas trazem conforto e alegria, pois lhe dão a certeza de que o filho está bem. “Cada carta é uma mais linda que a outra, eu adoro todas. Se não tivesse essa comunicação, não sei o que seria de mim”, desabafa.




TRECHO DA CARTA PSICOGRAFADA DE PEDRO HENRIQUE

“Mãe, pai, a vida não acabou para mim. Eu cumpri minha jornada e retornei para casa do pai maior, aqui tudo é igual e feliz. Eu os amo tanto e isso não acabou dentro de mim, confesso que com estudos tudo fica mais claro. Pensem na alegria de nossa casa. Eu lembro que em nossa casa nós vivemos com tantas festas, as recordações boas motivaram a alma, em casa nós colhemos o amor e a espiritualidade. Sempre adorei deitar em teu colo mãe. Quando eu bagunçava o quarto e tu me ‘cobrava’, eu dizia que não tinha tempo, aliás meu tempo sempre parecia pouco, mas eu os agradeço por tudo, eu os amo tanto, fica em paz”. (Primeira carta, dia 28 de janeiro de 2015).

Fonte:
arquivo pessoal



“Eu acredito que estou de pé pelas cartas que recebo...”




DICA DE FILME


O longa-metragem “As mães de Chico Xavier” (2011), baseado em fatos reais, conta a história de três mães, Ruth, Elisa e Lara, que passam por situações difíceis com seus filhos. Essas mulheres buscam a ajuda do médium Chico Xavier, onde recebem conforto espiritual e reencontram a esperança na vida.




UM ANJO NO CÉU


Assim que decidiram ter o primeiro filho, a empresária e comerciante Fernanda Müller Pereira, 38, e o técnico em contabilidade Aristides dos Santos Rodrigues, 35, procuraram o médico para fazer os exames de rotina. A gravidez foi tranquila e monitorada, sem nenhuma anormalidade. Fernando nasceu no dia 5 de agosto de 2013 e próximo dos 8 meses foi diagnosticado com síndrome de West (uma forma grave de epilepsia infantil).
“O Fernandinho surpreendeu a todos, pois tinha uma evolução normal, ao contrário do que o diagnóstico previa. Já estava há cinco meses sem crises quando tudo aconteceu”, relatam os pais. Fernando teve infecção generalizada com falência múltipla dos órgãos desencadeada por pneumonias de repetição aos 2 anos e 6 meses de idade no dia 16 de fevereiro deste ano.


Batismo de Fernando (9 meses), em maio de 2014



A SUPERAÇÃO DA DOR

A busca por explicações levou Fernanda e Aristides para a casa espírita e o casal encontrou conforto nas cartas psicografadas. “Isso nos ajudou muito a superar a dor, quebrar paradigmas e seguir em frente”, afirmam.


“Além do consolo, as cartas trazem informações, instruções, sabedoria e o testemunho da continuidade da vida”.
FERNANDA MÜLLER PEREIRA E ARISTIDES DOS SANTOS RODRIGUES



Fernando com 2 anos e 5 meses junto dos pais na Praia de Atlântida, em janeiro último


TRECHOS DAS CARTAS PSICOGRAFADAS DE FERNANDO

“[...] Não pensem que tudo isso acabou, eu voltei para cá para me preparar e preparar os nossos corações para um futuro melhor, isso é uma forma de espiritualizar a alma. Não pensem jamais ser um castigo de Deus, Ele não tirou um anjo dos vossos braços, Ele nos abençoou com a oportunidade de todos nós crescermos, muitas dores são bênçãos para a alma...”. (Primeira carta, psicografada em 2 de junho de 2016)

“[...] Eu apenas moro em outro plano, onde eu estava antes de renascer, fizeram por mim tudo que era possível e me deram uma sobrevida confortável, muito além do que a medicina podia prever, eu sou grato por tudo isso, o vosso amor dedicado venceu barreiras e me doou à vida uma dose a mais de amor e isso é o que me fortalece desse lado e me dá ânimo e paz para retornar ao nosso ninho, como fazíamos com os cobertores na sala, eu estou feliz...”. (Segunda carta, psicografada em 3 de junho de 2016)

“[...] A caridade é a luz que clareará o rumo ao qual eu desejo renascer, o lar amigo e feliz é aquele que ama além dos laços da consanguinidade, que ama os filhos do calvário que surgem a toda hora em nossos caminhos, eu os amo como sempre amei, vocês curaram o meu corpinho com o vosso amor e no futuro distante eu cuidarei de vocês...”. (Terceira carta, psicografada em 5 de junho de 2016)

Fonte: arquivo pessoal



ENTENDA MELHOR A PSICOGRAFIA


O trabalho de psicografia é realizado pelo médium (alguém que possui faculdade mediúnica apurada) para captar e colocar a ideia do espírito no papel. Os espíritos relatam nas cartas sua condição atual, falam também da saudade que sentem, do local onde estão e o que fazem. “Costumam citar fatos que só quem está recebendo identifica como prova da veracidade”, explicam Mariângela e Ricardo. Essas mensagens, enviadas por seres que não estão neste plano, normalmente são destinadas a familiares ou amigos e têm caráter consolador.

“Através do conteúdo, que possui particularidades percebidas pelo receptor, é comprovada a continuidade da vida, o que vem desbancar a ideia de morte como fim de tudo”, justifica o casal. A psicografia é feita em casas espíritas por haver ambiente espiritual propício. O acesso é gratuito e o público assiste a todo o trabalho, da escrita até a leitura das cartas.



2 PERGUNTAS PARA MARIÂNGELA E RICARDO


POR QUE NEM TODAS AS PESSOAS RECEBEM AS CARTAS?


“Primeiro, pelo grau de necessidade do escrevente e do destinatário (alívio da dor, da saudade). Também há que considerar o merecimento (ações no bem) de quem escreve e de quem recebe. A condição evolutiva em que se encontra o espírito também pesa muito. Segundo, há de se considerar questões físicas do médium, já que há muita gente querendo receber e o desgaste de energia é muito grande”.

OS ESPÍRITOS QUE FALAM COM SEUS FAMILIARES ATRAVÉS DAS CARTAS SÃO ESCOLHIDOS?

“São escolhidas pela espiritualidade maior, sem interferência do médium, de acordo com as condições acima, necessidades e merecimento de ambos os lados. Chico Xavier dizia: ‘O telefone toca de lá para cá’, mas é preciso que haja procura de quem recebe, pois se ninguém ‘atender’ cai no vazio. Não há tempo definido para que um espírito se comunique, pode ser horas, ou muitas décadas, depende, como falamos, das condições de ambas as partes (espírito e família)”.



“Alma é definida como o espírito ainda encarnado”. Allan Kardec

 

SAIBA MAIS

O livro “Nossa nova caminhada”, lançado em 2014, traz psicografias de sete jovens que desencarnaram na boate Kiss. Em suas 103 páginas constam descrições das vítimas, inclusive de Guilherme Pontes Gonçalves. Nas cartas, todos espíritos falam que estão bem e também relatam saudade. A obra foi organizada pela jornalista Lidiana Betega e a produção contou com a ajuda de familiares. Toda renda do livro é doada para caridade.


 

 

CONFIRA ABAIXO UM TRECHO DO LIVRO ASSINADO POR GUILHERME:

“Despertei deste lado como se desperta toda manhã, num lugar lindo e cheio de paz. Não sou espírito devedor, o que me garante paz deste lado. Fui um jovem como todos os outros, me diverti muito acompanhando os amigos da época. Curti o que pude da juventude que eu tinha na terra, sempre fui guiado por vosso amor e vossos cuidados, nosso lar sempre foi bom. Quero que continuem firmes. Há um propósito maior em Deus para que todos nos retornássemos reunidos, mas não sei explicar ainda, mas sei apenas que seguimos por aqui amados como sempre amamos, aprendi a dominar a saudade e extrair-lhe as possíveis dores”.



O QUE NÓS VIMOS


A reportagem da revista LINDA acompanhou duas sessões mediúnicas entre os dias 3 e 4 de junho nas sociedades espíritas Caminho da Salvação e Nosso Lar, onde o médium paulista Nilton Cesar Stuqui realizou a psicografia das cartas. As casas tiveram lotação máxima. Nem todos puderam ser atendidos, mas assim que algumas famílias foram chamadas, o choro veio num misto de alegria e conforto. Muitas pessoas saíram de mãos vazias, mas com a alma cheia de paz e esperança.


 

 

 

Tudo passa...
“Todas as coisas na Terra passam.
Os dias de dificuldade passarão...
Passarão, também, os dias de amargura e solidão.
As dores e as lágrimas passarão.
As frustrações que nos fazem chorar... Um dia passarão.
A saudade do ser querido que está longe, passará”.

 






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